sexta-feira, 1 de julho de 2011

Uma crônica de protesto

*Por Raimundo Moura

Memórias que não conseguirão matar

Cresci assistindo os noticiários de violência que acontecem no Estado do Pará. Movimento de Garimpeiros termina em chacina na Ponte Rodoferroviária de Marabá! Sem terras são massacrados na curva do S em Eldorado dos Carajás! Sindicalista é assassinado na porta de casa em Rondon do Pará! Família é executada em Morada Nova! Freira Americana é assassinada em Anapu!

Essas notícias passaram a fazer parte da cultura de impunidade que impera no Estado, e principalmente na região Sul e Sudeste. Recentemente, mais dois crimes aconteceram! Desta vez contra um casal de ambientalista que vivia e sobrevivia da floresta.

José Claúdio e Dona Maria trabalhavam normalmente em seu pedaço de terra sem agredir a natureza. Dela extraia e beneficiava a castanha do Pará, da andiroba, da copaíba, do cacau, do cupu... Extraiam da floresta os derivados e transformavam-os em cosméticos, remédios e alimentos que eram comercializados nos municípios da nossa região.

Mas também lutavam contra o desmatamento! Isso foi o que mais incomodou os carvoeiros e os madeireiros do município de Nova Ipixuna. Denunciaram o assédio que esses faziam no Projeto Agroextrativista Praia Alta Piranheira e por isso foram covardemente assassinados.

Estive participando de uma atividade da turma de Especialização em Educação Ambiental, nesse Projeto Agroextrativista e constatei o quanto esse casal era importante na luta em defesa das florestas. Na residência do casal tudo estava como eles deixaram!

As sementes na estufa, o boné do Conselho Nacional dos Produtores Extrativistas sobre a mesa, e o gato e um cachorro que visivelmente esperava na pura espera a chagada de Zé Claúdio e Dona Maria.

O gato ainda miou, como se estivesse perguntando pelos seus donos, agora o cachorro sequer levantou... Parece que já sabia que nunca mais veria os seus donos, por isso permanecia imobilizado e em estado de greve animal há exatamente um mês.

Dois meses antes, o professor José Pedro havia acertado com a Dona Maria na UFPA a nossa visita para conhecer essa experiência agroextrativista, mas por conta do período chuvoso a própria Dona Maria que era também aluna do curso de Pedagogia do Campo, sugeriu que esperássemos o verão chegar, pois as estradas não estavam conservadas.

Assim foi feito, chegamos à majestade (nome dado a uma árvore de estimação do casal) ansiosos para conhecer essa experiência agroextrativista, mas faltaram o Zé Claúdio e a Dona Maria para nos receber, assim como era de costume fazer com tantas outras turmas de estudantes e pesquisadores.

No local onde o casal foi assassinado, sobre o pé de uma imensa árvore, foi erguida uma pedra com uma das várias denúncias que o Zé Claudio e Dona Maria fizeram: “o que fizeram com o Chico Mendes no Acre e com a Irmã Dorath em Anapu, querem fazer também com a gente... E realmente eles fizeram!” Mataram no ano internacional das florestas quem defendiam as florestas, deixando um vazio no coração da Amazônia e dos ambientalistas que permanecem vivos, lutando para que as nossas florestas não virem carvão para alimentar a ganância dos capitalistas.

* Raimundo Moura é professor da rede pública de ensino.

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